quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Post-it vazio

  "O que é que mudou?" esta era a única pergunta que lhe restava do sonho quando acordou, e a pergunta que ela fazia era se o seu passado a iria continuar a atormentar eternamente.
  Ela havia mudado de cidade e deixado tudo para trás e com que sentido? Tinha voltado a possuir uma triste, aborrecida e repetitiva rotina! Claro, tinha deixado o seu namorado que a tratava como ela nunca merecera, mas arranjara outro pior. Deste novo namorado ela pouco sabia, sabia essencialmente que ele a traía e dentro da sua própria casa. Ela não o amava, não, apenas não gostava da ideia de se sentir sozinha.
   Mas havia pior, as saudades que ela sentia dos seus antigos amigos. Frequentemente questionava-se se eles ainda se lembrariam dela. Os seus novos amigos nunca seriam nem perto daquilo que todos os outros tinham sido! Estes novos amigos era raro o dia em que não estavam drogados o suficiente para não lembrarem o dia anterior, quanto mais preocuparem-se com ela!
   Já chegava de pensamentos estupidamente profundos e negativos, era um novo dia e a bem ou a mal ela teria que o viver. Levantou-se e arranjou-se, o seu namorado já tinha saído. Foi tomar o pequeno almoço mas os armários estavam vazios, pensou então que iria comer no caminho mas ao abrir carteira também esta estava vazia... Ao menos já sabia onde tinha ido o namorado!
  Lá foi ela para o seu estúpido emprego, num call center, e tipicamente com o estômago a dar horas. Sem dinheiro, não iria conseguir comer nada até à noite. Ela já odiav o emprego, mas quando ia trabalhar com fome conseguia ser ainda mais insuportável. Mas as oito horas de trabalho lá acabaram por passar...
   Eram finalmente sete horas da tarde, e o seu telemóvel tocou. Era o namorado a dizer que a iria buscar ao trabalho. Ele chegou, ela entra no carro e cumprimenta-o com um beijo. Ele pergunta-lhe como tinha sido o seu dia, e ela diz que tinha sido bom, pois a verdade é que ele não se interessava nem um pouco com o dia dela.
   Foi jantar com o grupo de amigos, mas foi horrível... Eles, como sempre, estavam desligados do mundo e ela desejava mais que tudo estar morta. Saiu do jantar e foi para casa, ali ninguém iria dar pela falta dela, nem agora, nem nunca.
   No caminho para casa ela sentia-se novamente fria, vazia e infeliz. E não foi por chegar a casa que o sentimento desapareceu, aliás, nunca desaparecia por mais que ela tentasse. Ela fumou, fumou muito. Bebeu, imenso na verdade. Drogou-se, demasiado até. Tudo em vão, o sentimento teimava em não desaparecer e portanto ela decidiu mudar tudo. Arregaçou as mangas e com uma faca de cozinha bem afiada fez cortes profundos aos longo das suas veias. Viu todo o seu sangue a fugir de si, a vida a ir-se embora a desaparecer e pela primeira vez em muito tempo deixou de sentir.
  São seis da manhã, descobriram-na morta em casa agora. Ninguém a chorou, ninguém sentiu a falta dela e nada mudou.

Sem comentários: